quarta-feira, 14 de agosto de 2013

Partos no Parto

O parto me trouxe muitas mudanças. Não a chegada do meu filho, mas o parto em si. Pari dores, medos, frustrações, inseguranças, frescuras, preconceitos. Meu filho eu agarrei nos braços, o resto ficou ali, no misto de água e sangue na piscina. Pode soar estranho a quem nunca teve um parto respeitoso. Falo parto respeitoso porque parir normal da forma que acontece em grande parte dos hospitais Brasil a dentro não permite esta epifania. Pois bem, saí do parto transformada. 
Por muito tempo fui a mulher moderna, como manda o figurino. Afogada em cobranças de beleza, trabalho, tempo. Reproduzia discursos que me foram impostos de maneira tão natural, desde criança, que acreditava veementemente que eram discursos meus. Interiorizava muitas das incapacidades impostas por uma sociedade machista e puritana. Sem perceber me espelhava no padrão da mulher de plástico. Quem quiser um bom texto a respeito, dá uma lida nesta publicação da TPM, incrivelmente excelente.
Mesmo passando por transformações imensas durante a gestação, muito ainda precisava ser transformado. E eis que veio o parto. Na hora que eu não esperava, do jeito que eu jamais imaginei que seria. Em meus sonhos meu filho seria aparado por mim, em um parto tisunâmico, quase indolor. Mas eu não estava preparada pra isso. Eu tinha muitas coisas para parir no meu parto, não dava pra sair tudo assim, escorregando feito quiabo. E nas horas que caminhei pela casa, tudo mudava em mim. Mesmo totalmente irracional - e pra parir precisamos mandar a racionalidade pra longe - tudo se transformou. 
Depois de horas de dor, de bolsa rota, de mecônio, eu finalmente consegui por pra fora a fêmea feroz que sempre viveu reprimida em mim. A fêmea que enjaulei quando acreditei nesta sociedade asséptica, limpa, estéril. A fêmea que deixei de alimentar quando acreditei que a feminilidade cabia em saltos altos, pernas depiladas e "roupas sensuais". Mas o parto abriu a jaula. E ela saiu louca. E fizemos as pazes. E senti o cheiro de amor, de ocitocina e de sangue que estava no ar. Cheiro de mim. Descobri a doçura do cheiro de sangue. O sangue que por diversas vezes achei nojento, o líquido que acreditei ser um castigo mensal em minha vida. Não, o parto me mostrou que o sangue é meu e é bom. Aquele instante me faz agradecer diariamente a dádiva de ser mulher.
Parir doeu. Doeu muito. Mas toda a força avassaladora que estava em mim não sairia de maneira delicada. Precisava desta dor. E com a força que fiz, pus pra fora toda desconfiança que eu tinha que meu corpo não conseguiria. Deixei naquela água os medos que me impuseram durante toda a minha vida. Deixei de ser coitada. Saí do raso e fui fundo em mim. Vi muito além do que dizem ser uma mulher. Nesse olho no olho com a fêmea que sou, percebi que o corpo perfeito não cabe em números. Que perfumes não gostosos, mas que meus cheiros também são. Fiz as pazes com minha intuição, com meu poder e com meu sangue.
Inquestionavelmente saí do parto me sentindo poderosa, mais segura. Hoje pouco importa se meu cabelo cacheado não é considerado elegante, se minhas unhas não estão sempre feitas ou se meus sapatos de salto estão guardados em caixas no topo do roupeiro. Não caibo em padrões. Assim que pari olhei para aquele guri gordo e graúdo, respirei fundo e conclui que sou foda - não encontro palavra que consiga descrever melhor a sensação - e essa sensação ninguém consegue me tirar. 

quinta-feira, 1 de agosto de 2013

Para a patrulha anti-peito

Pra quem não sabe, hoje é o dia mundial da amamentação. Um dia de conscientização, de informação e de luta. Esta semana muitas manifestações serão realizadas pelo País, com o intuito de lembrar às mães e à sociedade o quanto amamentar é importante. Nas bandas de cá, em 6 dias completaremos 12 meses de amamentação. 12 meses de troca, de vínculo fortalecido, de olhares trocados, de amor líquido. Não posso negar, me orgulho demais de estarmos atingindo esta marca. Porque? Porque amamentar no Brasil é pra quem tem raça! Não, não é pra quem tem leite. Sinto informar, mas leite todo mundo tem. O que faltou à mãe que queria amamentar e não conseguiu foi informação e apoio. Pra amamentar não basta querer. 
Se você tem dificuldades com a amamentação, esqueça o chá que sua mãe mandou fazer, a mandinga que a sogra ensinou e, principalmente, o conselho do seu pediatra e/ou ginecologista fofo. Busque a ajuda certa, vá a um banco de leite, procure uma especialista em amamentação, alguém que realmente entenda do assunto. Todo o resto serve apenas para confundir e desencorajar. Mas meu post hoje não é pra explicar sobre a amamentação ou ajudar quem tá começando. Hoje me dirijo a você, que vira o rosto quando vê alguém amamentando em público, que acha um absurdo tirar o peitão na rua. Você que acha imoral amamentar um bebê de dois anos mas não perde uma cena da novela das oito! Você que carinhosamente chamo de patrulha anti-peito! É a você que dedico estas mal traçadas linhas!
Pra começo de conversa, vamos deixar clara a utilidade dos seios femininos. Eu sei que a mídia e a sociedade machista te ensinaram que os seios servem para seduzir e erotizar, mas essa não é exatamente a função principal dos peitões. Sinto muitíssimo te desapontar, mas a não ser que você seja um bebê, os seios não foram feitos para te satisfazer. Como em todos os mamíferos - sim, eu sei que você aprendeu isso na aula de ciências, somos mamíferos - as tetas servem para alimentar a cria. E se é pra isso que eles servem, nada mais justo que os utilizemos para seu devido fim. Então, saco as peitolas em qualquer lugar, a qualquer hora, para alimentar a minha cria. E não vejo motivo para me envergonhar. Se você, de alguma maneira, acredita que uma mulher que amamenta em público está querendo chamar atenção e/ou seduzir quem quer que seja, lembre desta lição. Tetas são para os filhotes. E por mais que você tenha uma mente de filhote, sua fase já passou.
Ah, jamais, nunca, em hipótese alguma, ofereça um paninho para uma mulher cobrir os seios. Você come de cara coberta, cara pálida? Porque acha que o pobre do meu filho vai se sentir mais confortável se alimentando com um pano na cabeça? Você come no banheiro? Então siga a mesma lógica, não espere que uma mulher se sente em um banheiro para alimentar uma criança! Tá vendo como a regrinha de ouro é simples e vale muito? Se coloca no lugar do outro que tudo fica mais fácil. O bebê está se alimentando, recebendo carinho e atenção da mãe. Engraçado que dar uma mamadeira não escandaliza ninguém. Tem algo errado, né não?
Ultimamente começo a sofrer uma pressão que não esperava que acontecesse tão cedo: O desmame. Alguém pode me explicar porque cargas d'agua as pessoas se incomodam tanto com um bebê mamando? Ah, seu pediatra disse que depois de um ano o leite materno não serve para mais nada????? Pois bem, façamos o seguinte, peça que ele estude bastante, faça uma pesquisa séria, publique em uma revista científica bem reconhecida e transforme a asneira que fala em argumento. E chega de mimimi. Ah, tem uma hora que a gente perde a paciência. Depois de quase um ano explicando, conversando e fazendo cara de alface, decidi partir para a grosseria. A teta é minha e o filho é meu. Se tá bom pra gente, ninguém tem nada com isso. Um dia ele para de mamar, na hora dele, no nosso tempo. Não se preocupe, nunca vi menino de 15 anos pendurado no peito da mãe. 
Agora vamos com a tia Elisama fazer um resumo das lições de hoje, repete comigo: " O peito serve para alimentar um filhote, vou deixar de ser machista e burro e respeitar o momento da amamentação. Nunca mais vou dar opiniões enfraquecedoras e desencorajadoras, nem falar do que não entendo. Também não vou oferecer paninhos, torcer a cara ou perguntar quando o bebê vai parar de mamar. O leite materno é saudável, forte e adequado."  Agora vá pro cantinho do pensamento e só saia de lá quando entender que a amamentação alheia não lhe diz respeito. Se não conseguir entender isso, corra para terapia. Só Freud explica.

P.S. O "cantinho do pensamento" é uma forma de educação inapropriada para crianças, utilizei no texto por ser dirigido a adultos. Não apoio nenhum tipo de castigo, nem físico, nem moral.