Volta e meia vejo um amig@ postando em uma rede social imagens valorizando as palmadas, com dizeres do tipo: "Eu agradeço aos meus pais as surras que levei." Sinto muito, meu querido amigo, se você agradece aos seus pais as palmadas que você levou. Não, eu não agradeço as palmadas que levei. Não agradeço por ter aprendido que a violência é uma forma de linguagem. Não agradeço por ter aprendido que o mais forte pode bater no mais fraco. Não agradeço ter aprendido que, as vezes, a violência é uma forma legítima de amor. Sim, violência. Palmadas e cintadas são violência. Agradeço sim, aos meus pais, pelo carinho e amor que sempre me deram. Pelas várias vezes que se acalmaram e conversaram. Pela preocupação em me manter sempre bem. Pelo colo, pelos beijos, pelos abraços. Por terem acreditado em mim. Agradeço, principalmente, o exemplo que sempre me deram, esse sim, me educou e me moldou. Agradeço ao meu pai por me mostrar que preciso ser determinada, forte e sincera. À minha mãe por me ensinar a ser sempre compreensiva e branda. Inúmeros são os motivos que tenho a agradecer. Mas a palmada não está entre eles.
Meus pais apanharam bastante dos meus avós, tiveram uma criação sem diálogo ou respeito. Pai manda, filho obedece, sem explicações, sem conversa. Aprenderam que a surra educa. Diante da criação que tiveram, fizeram o que acreditavam ser o melhor. Introduziram o diálogo e deixaram a palmada apenas para as situações em que " a conversa não resolvia". Certamente meus avós apanharam ainda mais dos meus bisavós. Mas esse ciclo acabou aqui. Nesta família, a minha geração foi a ultima a ser agredida fisicamente. Meu filho não o será. Não é esta a linguagem que usamos e usaremos em nossa casa. Ele não aprenderá que violência educa. Não aprenderá que encerrado o diálogo a agressão será a única saída. Já acreditei que a palmada é uma forma legítima de educar. Inofensiva. Escondia os reais sentimentos que ela sempre me causou. Aliás, esta é a conduta mais comum em toda vítima de violência. Negar que foi violentado. Negar o medo, o terror, a angústia, a dor. Se culpar. Acreditar que causou a agressão. Meu filho não conhecerá esse sentimento. Não olhará para a porta, ansioso e assustado, enquanto apanha, esperando que alguém chegue e o salve. Agressão física é descontrole. Ele não pagará pelo meu descontrole, não é dele a conta por eu ter pedido a paciência. Se eu perdi a paciência, sou eu quem devo me acalmar e recuperá-la.
Como ensinarei meu filho a não ameaçar, se sempre o ameaço? Como ensinarei que não deve agredir os coleguinhas e os irmãos se eu o agrido? Como ensinarei que deve buscar sempre o diálogo se eu, adulta, não sou capaz de dialogar? Quando enxergaremos que palmadas são violência? Quando assumiremos, para nós mesmos, que fomos violentados? Quando choraremos a nossa dor? Quando veremos, nos olhinhos suplicantes do filho agredido o nosso próprio olhar? Quando lembraremos que as surras nos trouxeram apenas medo e angústia, nada mais? Quantas vezes vemos em nós mesmos o comportamento dos nossos pais? Aprendemos mais com os exemplos ou com as agressões?
Te aconselho, caro amiga@ que apenas reproduz um discurso irracional, a parar e pensar. Te aconselho a voltar um pouco à infância e, sem fazer piada ou esconder seu sentimento, pensar em cada vez que levou uma "inofensiva" palmada. Deixar de lado as velhas verdades e sentir suas próprias dores.Verá que jamais aprendeu algo de bom com uma palmada. Que não repetiu o "erro" apenas por medo. Que com a palmada aprendeu apenas a não questionar, a se anular, algumas vezes a mentir. Enxergará que as palmadas refletem até hoje, negativamente, em sua vida. Antes de levantar a mão para o seu filho, lembre do horror que sentia quando via uma mão erguida. Use a mão para acarinhar. Existem maneiras positivas de educar e ensinar. Não é fácil, mas é gratificante. Quebre os ciclos, mude o rumo. Agradeça aos seus pais o que realmente merece agradecimento. Eles com certeza merecem muitos agradecimentos. Meus pais me amaram e amam muito. Buscaram em todo o tempo acertar. Mas erraram, e este erro eu não quero e não vou repetir.